Saudades romeiras do Papa Francisco

Saudades romeiras do Papa Francisco
Se há uma mensagem que caracterizou o pontificado de Francisco mais do que qualquer outra, e que está destinada a permanecer, é a da misericórdia. Muitos foram os temas abordados pelo Papa Francisco, em particular a atenção aos pobres, a fraternidade, o cuidado com a Casa Comum, o decisivo e incondicional não à guerra. Mas o coração de sua mensagem sempre viva e atual é o chamado evangélico à misericórdia. “Vivemos da misericórdia e não podemos nos permitir de ficar sem misericórdia: ela é o ar que respiramos. Somos pobres demais para estabelecer condições, precisamos perdoar, porque precisamos ser perdoados”, escreveu Papa Francisco. Dele, gravo na memória quatro encontros pessoais, dialogando sobre a causa do Pe. Cícero.

O primeiro foi no ano de 2013, numa audiência particular de quase meia-hora. Após apresentar algumas notícias da Diocese de Crato, particularmente sobre a motivação pastoral para com as romarias e os romeiros do Pe. Cícero Romão Batista, informei o recém-eleito Papa sobre o encaminhamento e estudo de um Processo de reabilitação histórico – eclesial do Pe. Cícero na Congregação pela Doutrina da Fé. O Papa Francisco escutou-me com interesse, anotou algo num papel e prometeu ver pessoalmente a questão.

Lembro que naquela ocasião partilhei com o Papa algumas dificuldades que vinha enfrentando no meu ministério de bispo de Crato. E o Papa Francisco me encorajou: “Perdoa. Perdoa”. E acrescentou: “Eu também enfrentei algo semelhante em Buenos Aires e pedia a Deus a graça de perdoar as pessoas que me faziam sofrer”.

Nesta mesma audiência em 2013 pedi ao Papa de gravar um vídeo abençoando os participantes do 13º Intereclesial das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) que aconteceria em Juazeiro do Norte – CE, com o tema “Justiça e Profecia a serviço da

vida” e o lema “CEBs: romeiros do Reino no campo e na cidade”, de 7 a 11 de janeiro de 2014. E o Papa Francisco, prometendo uma mensagem (a primeira de um Papa na história das CEBs), abençoou o evento e enfatizou: “O futuro da Igreja está nas pequenas comunidades”.

Em 2015, tive outra oportunidade de diálogo com o Papa Francisco sobre o Pe. Cícero, entregando-lhe uma carta a nome de um grupo de romeiros. A resposta não hesitou a ser enviada por meio de uma carta redigida pelo Card. Secretário de Estado do Vaticano, o Card. Pietro Parolin: nesta carta o Papa reconhece as virtudes humanas, cristãs e sacerdotais do Pe. Cícero, o “Reconcilia” com a Igreja e encoraja as romarias. Isso ocorreu no Ano do Jubileu da Misericórdia.

Enfim, a mais recente e última recordação que guardo no coração, e na página inicial do meu computador, refere-se à minha despedida do Papa Francisco após a “visita ad limina” do Espiscopado cearense em Roma, em maio de 2022. Estivemos juntos em dois momentos: no primeiro foi em uma roda de conversas com todos os bispos do Regional Nordeste 1. O Papa nos acolheu muito bem. Depois, pediu que fizéssemos perguntas: „Se quiserem criticar o Papa, podem criticar. Se quiserem fazer alguma pergunta, podem fazer‟. O Papa Francisco tinha bom senso de humor e era sério na escuta. Ali tive a oportunidade de mais uma vez rememorar o caso do Pe. Cícero e repetir as palavras dos romeiros “meu Padim é Santo”. E, em outro momento, a sós, o Papa, em cadeira de rodas, ao saudar-me, levantou o punho da mão, olhou-me nos olhos e disse: “Bispo forte”. O fotógrafo pontifício ao lado imortalizou esta cena.

Obrigado, Papa Francisco.

Roma, 25 de Abril de 2025.

Dom Fernando Panico, M.S.C.

Bispo emérito de Crato

FONTE: Diocese de Crato